sexta-feira, 5 de setembro de 2008

O real valor da verdade

Sempre gostei de ficção. O primeiro livro que li na adolescencia era de ficção e desde então sempre procurei esse gênero, passando por Joaquim Manuel de Macedo, Arthur Conan Doyle, até J.R.R. Tolkien e J.K. Rowling.


Daí para os filmes de ficção foi menos do que um pulo. Amo e sempre amei os desenhos da Disney e hoje me vejo fascinada pelos filmes de Tim Burtom, Spielberg , Peter Jackson e pelas animações da Pixar.

Namorido gosta de ficção também, mas prefere as coisas mais históricas. Quando vimos "Uma Mente Brilhante" ele se emocionou, mas quando eu falei no cinema "é uma história real" ficou com lágrimas nos olhos. O que me faz ficar com uma dúvida na cabeça: os acontecimentos históricos, os fatos, são mais importantes, emocionantes e merecem mais valor do que os inventados?

Comecei a pensar no assunto estimulada pelos textos do Alex Castro, onde ele desconstrói uma série de idéias pré-concebidas pelo senso comum, as quais chama de prisões.

Lá ele cita uma história pitoresca que achei engraçadíssima e que ilustra o que estou falando:

"Faz pouco tempo, a Reuters noticiou a história de um romeno de 67 anos chamado Constantin Mocanu. Uma galinha em seu quintal não o deixava dormir. Irritado e insone, ele pegou uma faca, correu pro jardim e cortou fora o pescoço do animal.

Infelizmente, no escuro, na pressa, na confusão, o senhor Mocanu acabou cortando fora o próprio pau.


A história fica pior, pois o cachorro do senhor Mocanu, atraído pelo barulho e pelo cheiro de sangue, pegou o pau, comeu e saiu correndo.

O senhor Mocanu foi levado para uma emergência e passa bem."

Aí ele diz: "
Mostrei essa história para dezenas de pessoas. Para minha grande decepção, a maioria demonstrou algum tipo de ceticismo. (...) e daí se o fato aconteceu mesmo? A história deixa de ser sensacional por causa disso? ". O fato é: não. Não faz a menor diferença se é verdade ou se é mentira. A história é divertidíssima e, se for mentira, muito criativa e merece créditos por isso. Tenho certeza que a maioria ficou boquiaberta, escandalizada ou no mínimo a achou hilária. É isso o que vale.

Não sei qual é a graça maior que se tem em saber que um filme ou um livro é baseado em fatos reais. Pra começo de conversa, se é baseado, não é a realidade transcrita. Quem escreveu, certamente deu uma romanceda, aumentou eventos mais interessantes e deixou de lado os menos emocionantes. Então, no fim das contas, real ou irreal, o que conta é a capacidade do autor de contar a história. O resto é secundário.



Para ilustrar a discussão, cito o filme Big Fish (Peixe Grande) do Tim Burton.
Em Peixe Grande, Ed Bloom (Albert Finney o representa na velhice e Ewan Mcgregor na juventude) está morrendo de câncer. Seu filho Will (Billy Crudup) vem da França com a esposa para passar os últimos dias ao lado dele e da mãe (Jessica Lange). Só que Will nunca conseguiu se aproximar do pai por achar que o pai só transmite a ele uma imagem falsa e fantasiosa dele mesmo.

Quem já viu o filme sabe que Ed é um cara que romanceia a sua vida. Todos os acontecimentos da sua vida têm um Q de fantástico e surpreendente. Quando vai contar a alguém como conheceu sua esposa, não diz simplesmente: estava no circo quando a vi pela primeira vez. Ahei-a linda e tentei me aproximar, mas não consegui porque uma multidão a arrastou para fora do circo e a perdi de vista. Não. Para Ed é assim: quando dizem que o mundo pára quando encontramos a nossa alma gêmea, dizem a verdade (aí mostra todos os personagens, platéia, animais, todos paralisados enquanto Ed se aproxima lentamente de sua futura esposa
- a imagem acima foi capturada nessa parte do filme)...mas o que não dizem é que o tempo depois se acelera para poder compensar (aí mostra a multidão saindo com rapidez do circo, levando a garota, as pessoas entrando em seus carros, os artistas de circo esvaziando o picadeiro) . Isso é que é saber contar uma história, tornar os fatos cotidianos mais alegres, mais interessantes.


O filho de Ed não se aproxima do pai justamente por isso. Acha que o pai mente, quer chamar a atenção para si. Will fica cego com esse dogma de que a verdade é mais importante do que tudo. Ahhh....que se dane a verdade. Que venham as fábulas e a fantasia. A realidade é muito dura e essa cegueira diante da verdade deixa as pessoas infelizes, carrancudas e amarguradas. O melhor caminho para uma vida feliz é fantasiar, sonhar, viver com os pés acima do chão.

Abaixo, o trailer de Big Fish. Mesmo que você não seja fã de ficção, vale a pena assistir. Namorido amou, sempre chora no final.


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