Dra. Clara, médica pediatra e nutróloga, é a inventora da multimistura. A idéia surgiu quando a médica trabalhava no interior do Pará, em Santarém, para recuperar crianças desnutridas. "Para salvá-las era necessário trabalhar as potencialidade nutricionais da região e pensar em um alimento com valor nutritivo de baixo custo, paladar regionalizado e de preparo rápido", explicou a médica. A Pastoral da Criança adotou a idéia e está há 25 anos trabalhando com a multimistura, que já está em todos os estados brasileiros e em 15 países.
Os estudos da Dra. Clara revelaram que é possível obter essa complementação nutricional a baixo custo a partir do aproveitamento das partes dos alimentos que geralmente são desprezadas.
Um dia, ela decidiu sensibilizar o Ministro José Alencar para a sua causa. Era manhã da quinta-feira 06/09. Ela começou a mostrar fotografias de crianças esqueléticas, brasileiros com silhueta de etíopes, mas que tinham sido recuperadas com sua farinha barata e acessível, a multimistura. Alencar marejou os olhos. Pobre na infância no interior de Minas, o vice-presidente não conseguiu soltar uma palavra sequer. Apenas deu um longo e apertado abraço em Clara.
A pediatra pediu ao vice-presidente que não deixasse o governo tirar a multimistura da merenda das crianças. Mais do que isso, ela pediu que o composto fosse adotado oficialmente pelo governo. Clara já tinha feito o mesmo pedido ao ministro da Saúde, José Gomes Temporão – mas ele optou pelos compostos das multinacionais, bem mais caros. “O Temporão disse que não é obrigado a adotar a multimistura”, lamenta Clara.
Em setembro, a luz da sala de Clara dentro do prédio do Ministério da Saúde foi cortada. Hoje, ela trabalha no escuro. “Já me avisaram que agora eu estou clandestina dentro do governo”, ironiza a pediatra. Mas ela nem sempre viveu na escuridão. Prova disso é que, neste mesmo mês, o governo comemorou a redução de 13% nos óbitos de crianças entre os anos de 1999 e 2004 – período em que a multimistura tinha se propagado para todo o País.
Clara acredita que enfrenta adversários poderosos. Segundo ela, no governo, a multimistura começou a ser excluída da merenda escolar para abrir espaço para o Mucilon, da Nestlé, e a farinha láctea, cujo mercado é dividido entre a Nestlé e a Procter & Gamble. “É uma política genocida substituir a multimistura pela comida industrializada”, ataca a pediatra. A coordenadora nacional da Pastoral da Criança, Zilda Arns, reconhece que a multimistura foi importante para diminuir os índices de desnutrição infantil. “A multimistura ajudou muito”, diz. “Mas só ela não é capaz de dizimar a anemia; também se deve dar importância ao aleitamento materno.” A ISTOÉ procurou as autoridades do Ministério da Saúde, mas nenhuma delas quis se pronunciar. “O multimistura é um programa que não existe mais”, limitou-se a informar a assessoria de imprensa.
Depois disso, fica a pergunta: por que o governo resolveu trocar um composto, extremamente barato, feito de restos de alimentos que podem ser encontrados em qualquer região do país para adotar um composto industrializado da Nestlé?
Quanto dinheiro está correndo por baixo disso?? Essa a pergunta que não quer calar.
sábado, 1 de dezembro de 2007
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